quarta-feira, 27 de março de 2013

Pateando el tablero?*

Fiquei pensando se meu último post deu a impressão de que eu sou super a favor de nego jogar tudo para o alto e viver sem lenço e sem documento, na maior irresponsabilidade. Fiquei pensando se pareceu que foi isso que fiz.

O que eu fiz não foi porralouquice. Se tivesse sido, problema meu, mas não foi bem assim. Eu saí do trabalho com outro engatadinho, bom salarinho e bem legal, mas temporário. E, durante o tempo que fiquei neste trabalho, fui me adiantando e vendo as possibilidades de viver um tempo como freelance depois, fazendo traduções. Assinei contratos, já fui fazendo alguns trabalhos e depois passei a viver disso, sabendo que seria uma situação temporária já que em breve eu voltaria pro Brasil. Além disso, tenho uma formação e conhecimentos que podem me ajudar a conseguir vários tipos diferentes de trabalho, o que me dá alternativas. Mas tem que correr atrás, ninguém vai bater na minha porta.

Eu na verdade sou a favor de nego fazer o que quiser da vida, desde que não prejudique ninguém. Viva sem lenço e sem documento, seja nômade, seja o que quiser, mas com um mínimo de responsabilidade consigo mesmo e com os outros. Sou a favor de ter a coragem de mudar coisas que não nos fazem felizes e que só nós mesmos podemos mudar, isso sim.

*"Patear el tablero" literalmente quer dizer "chutando o tabuleiro", mas seria o nosso equivalente a "chutando o pau da barraca".

segunda-feira, 18 de março de 2013

No ar antes de mergulhar

Como vai estar a sua vida daqui a três meses? A minha, eu não sei. Ninguém sabe, na verdade, a gente não sabe nem se vai estar vivo daqui a um segundo. Mas em geral, quando a vida tá na calmaria da rotina, você tem um certo grau de certeza de que, se nada de extraordinário acontecer, vai estar morando onde mora, trabalhando onde trabalha, de repente já tá até planejando uma viagenzinha ou uma festa pra julho.

Pois nem isso eu posso fazer no momento.

Daqui uns dias estou indo embora do país onde morei nos últimos dez anos. Ou seja, onde vivi praticamente 1/3 da minha vida, onde virei adultinha com contas pra pagar, onde desenvolvi quase toda a minha vida profissional, onde conheci meu amor. Vou voltar pro Brasil e, pelo menos até o fechamento desta edição, não sei exatamente onde vou trabalhar e o que vou fazer. É tudo um grande sei lá.

E sabem o que estou achando de toda essa incerteza? FANTÁSTICO. Isso era algo que antes me angustiava; no tempo que levei para decidir largar um emprego de anos que eu não suportava mais, eu morria de medo de não arrumar outra coisa, de não conseguir me sustentar, de deixar a estabilidade de uma grande multinacional para não saber bem quanto ia ganhar no fim do mês, mesmo que essa estabilidade estivesse custando a minha felicidade. 

Aí eu larguei o cazzo do emprego e fui feliz. Fiz trabalhos muito legais, tive que rejeitar outros trabalhos legais, consegui me sustentar. E vi que não é necessariamente uma coisa terrível você não saber que daqui a três meses você vai estar sentando na mesma escrivaninha, reclamando do mesmo chefe, mandando e-mails pras mesmas pessoas. Muito pelo contrário. É fascinante.

É fascinante pensar em quantas possibilidades eu tenho à frente. Dá um friozinho na barriga gostoso tentar adivinhar qual será a próxima cartada do destino, qual a entrevista que vai mudar a minha vida, qual casa vai caber no orçamento e conquistar meu coração, em que cidade vou estar. Seria legal conseguir um emprego que me permita trabalhar de qualquer lugar, aí eu daria umas viajadas e tals, mas também seria legal arrumar um empreguinho bacana na cidade que eu quero e que pague direitinho.

Claro que a ansiedade dá as caras. Aí eu fico ai meu deus, ai meu deus, aí eu como o que não deveria e o jeans fica apertado, aí penso em tudo que tenho que fazer antes de ir e digo ai meu deus. Normal e esperado nessas situações, acho.

Mas o mais importante, minha gente, é que em meio a tantas mudanças, incertezas e afins, estou feliz. E tenho quase certeza de que, daqui a três meses, vou estar ainda mais.




sexta-feira, 8 de março de 2013

Apenas mais uma homenagem infeliz às mulheres

Eu sigo uma rede de lojas de sapatos no Instagram. Aliás, nem sei por quê, já que os sapatos deles estão cada vez mais caros e pavorosos, cheios de tachas e caveiras e coisas excessivamente douradas. Aí puseram como "homenagem" hoje uma foto da Audrey Hepburn e a seguinte frase "ser mulher é: aguentar toda correria e fazer isso linda, de salto alto."

Verdade, né, gente? Ser mulher é isso aí, a frase resume muito bem. A gente só precisa "aguentar a correria" de trabalhar que nem uma louca, buscar as criança na escola, fazer o jantar, etc etc etc, linda e de salto alto. A gente não sua, a gente não fica descabelada, não tem vontade de tacar a porra do salto alto que está acabando com o nosso pé na cara do primeiro imbecil que aparecer na nossa frente. O nosso grande trunfo é estar sempre linda - e de salto alto - apesar dos pesares. Inclusive Audrey Hepburn estava sempre na correria nos filmes e nem por isso descia do salto.

Sugestões para melhorar a frase, se eles quisessem que ela tivesse algo a ver com sapato:

"Ser mulher é: aguentar toda correria sem tacar o sapato na cara de ninguém"

"Ser mulher é: se sujeitar a usar algo que machuca os pés porque dizem que assim é mais bonito"

"Ser mulher é: ter que ler imbecilidades no dia das mulheres falando de sapatos, beleza feminina e outras superficialidades"

Este post vai meio na direção do que eu escrevi uma vez aqui. Rola uma mania de identificar as mulheres apenas com sua beleza física, como se não houvesse nada mais, como se não tivéssemos nenhum outro valor. Ok, eu gosto de estar gatinha, de me sentir bonita, quem não gosta? Mas sou mais que isso, e vocês todas também. Também não tenho nada contra salto, inclusive eu uso - e sim, caio na armadilha de usar um sapato di-vi-no e altíssimo em um casamento e ficar sonhando com uma havaianas em vez de aproveitar direito a festa. Mas, repito, sou mais que isso. E no fim da festa, ou da "correria", não tô mais linda e já joguei o salto pra baixo da mesa e tô dançando descalça mesmo. Sou menos mulher por causa disso?

Preguiça de Dia das Mulheres nesse nível, viu.

segunda-feira, 4 de março de 2013

As viagens de Nadja VII - Perdida no Bosque

Por questões profissionais, minha mãe morou uns anos na Suíça. Aí eu tinha que passar pelo sofrimento de ir visitá-la todos os anos. País feio, tudo quebrado, mal-cuidado, ferrado, paisagens horríveis, perigoso, um horror.




Em uma dessas visitas eu tive a brilhante ideia de ir dar "só uma voltinha" no bosque que ficava atrás da casa dela para tirar umas fotos da paisagem invernal. Era só por uns poucos minutos porque logo depois íamos sair. Aí eu fui sozinha, sem celular, sem lenço e sem documento, só com a máquina fotográfica e enfurnada em umas 17 camadas de roupa. "Eu vou rapidinho e já volto".

Fui andando toda maravilhada, tirando mil fotos e gravando vídeos, brincando com a neve - porque brasileiro quando vê neve é aquela coisa mágica e jacu, a gente fica meio abobado mesmo, não adianta. Tava me sentindo em Nárnia:

Isso é a Nárnia do filme

Isso é o bosque. Não é iNgual?






Quando achei que já era hora de voltar, virei e fui andando na direção de onde vim. Legal. Até que apareceu uma bifurcação. E agora, José?

Escolhi uma direção e fui. E era tudo branquinho e congelado e neve e só. E eu não chegava. Aí vi umas escadinhas e resolvi subir para ver tudo de cima e me localizar. Não deu certo. Algumas casinhas, mas nenhum sinal de vida nelas.

Sim, eu estava perdida. Bem perdida. Aí eu andei, andei, andei, não sei nem por quanto tempo. Nada de placas, nada de chegar, só neve e casinhas sem sinal de vida ativa naquele momento.


Até que vi um senhorzinho entrando em uma casa. Fui lá e contei a ele, em um misto de inglês e alemão, que estava perdida. Até choraminguei um pouco pelo desesperinho da situação. Ele me fez entrar na casa, gritou algo para a mulher, pegou a chave do carro e disse "eu te levo" - pelo menos o endereço da minha mãe eu sabia de cor. Fui batendo o maior papo com o senhor, que tinha ido pro Brasil em mil-novecentos-e-aracy-de-almeida e me contou suas aventuras lá. Ele também me disse que realmente eu tinha andado demais e já estava até no município ao lado. Esse é o Hans, meu salvador:


Quando cheguei, minha mãe e o marido tinham saído para me procurar e não estavam. Encontrei um vizinho da minha mãe e contei a situação a ele, agora não lembro se para pedir o celular emprestado ou o quê. Mas logo eles chegaram e não se conformaram com como eu pude me perder por lá ("Achei que você tinha caído, quebrado uma perna e não conseguia voltar! Você é boba??")

Fique tão traumatizada com a história que tive que me consolar aqui:


(mentira, não fiquei traumatizada, mas fala pra mim se a loja da fábrica da Lindt não é um pedaço do paraíso na Terra??)